
Vozes da Resistência: O Direito ao Bem Viver de Mulheres Negras nas Favelas
Em abril de 2025, o Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento da ADPF 635, a conhecida “ADPF das Favelas”, que visava, em teoria, reduzir a letalidade policial no Rio de Janeiro. Infelizmente, a decisão acabou por aumentar a militarização nas abordagens policiais, levantando novamente questões sobre a segurança e a vida de comunidades vulneráveis.
Um caso emblemático que exemplifica os problemas estruturais nesse contexto é o da jovem Kathlen Romeu, que, em junho de 2021, foi morta pela Polícia Militar durante uma operação sem protocolos adequados. Sua morte, que gerou indignação nacional, não foi um caso isolado; meses antes, uma operação no Jacarezinho resultou em uma das maiores chacinas da história do estado. Esses episódios ocorreram mesmo sob a vigência da ADPF, evidenciando a continuidade da violência policial.
A proposta da ADPF visava restringir operações policiais a situações excepcionais, mas a interpretação ampla do termo permitiu que as forças policiais atuassem com grande autonomia. Apesar de anos de mobilização por estratégias que buscassem reduzir a letalidade policial, o STF reforçou práticas de repressão que foram amplamente denunciadas.
Entre as solicitações que foram negadas estavam medidas como a proibição do uso de helicópteros como plataformas de tiro e a criação de zonas de proteção em torno de escolas e hospitais. Em contraste, o governo do Rio anunciou a compra de um helicóptero militar, programado para entrar em uso em operações urbanas, o que representa uma intensificação do armamento nas favelas.
Além disso, a decisão do STF flexibilizou a exigência de suporte médico durante operações. Um projeto de monitoramento indicou que nenhuma das incursões em comunidades como a Maré, em 2024, teve suporte médico, refletindo uma grave negligência em relação à segurança e ao bem-estar da população.
A decisão ainda trouxe a possibilidade de ocupações territoriais, reforçando a concepção de que as favelas são espaços que precisam ser retomados, ao invés de entendidos como comunidades que devem ser protegidas e respeitadas. Essa visão é contraditória aos direitos humanos e às necessidades de segurança das populações locais.
O impacto da morte de Kathlen e de seu bebê é um triste lembrete da urgência em se repensar as políticas de segurança pública, especialmente no que tange às mulheres negras que frequentemente enfrentam condições de vida precárias e violência. Estas questões exigem uma abordagem interseccional que considere a complexidade das experiências de vida dessas mulheres, que muitas vezes são vulneráveis e marginalizadas.
Refletir sobre a vida e a morte de mulheres como Kathlen é crucial. Essas tragédias não são apenas perdas individuais, mas sim interrupções de vínculos comunitários e culturais valiosos. Em uma sociedade que lida com o racismo e a desigualdade, essas mortes não são casos isolados, mas parte de uma questão mais ampla sobre a justiça e a dignidade humana.
A pergunta que permanece é: como garantir que políticas de segurança pública respeitem e promovam o direito à vida de todos, especialmente dos mais vulneráveis? O clamor por justiça por Kathlen Romeu e por todas as mulheres que perderam suas vidas em circunstâncias semelhantes é um chamado à ação que não pode ser ignorado.