Como a Receita e o Direito Ambiental Estão Transformando a Geografia do Brasil

Ambiente Jurídico

Em 2015, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Receita Federal iniciaram um esforço conjunto para integrar suas bases de dados fundiária e tributária, com o objetivo de criar o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (Cnir). Essa proposta tinha a intenção de vincular os códigos dos imóveis devidamente registrados no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) às informações declaradas no Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). A atualização cadastral tornou-se uma exigência para proprietários e posseiros rurais, com a meta de consolidar dados atualizados sobre a malha fundiária nacional, permitindo melhor controle público e suporte a políticas públicas.

Entretanto, essa integração não se concretizou como esperado. O Cnir continuou inoperante, e o cruzamento de dados entre o Incra e a Receita Federal não foi suficiente. A falta de uma base cadastral confiável e validada levou a um aumento descontrolado da autodeclaração de terras. Em 2025, essa situação resultou na sobreposição de terrenos, fraudes e omissões, com cerca de um bilhão de hectares no Brasil, onde aproximadamente 15% apresentam irregularidades.

A crise na organização territorial tem raízes históricas. Desde o século 19, autoridades como Rui Barbosa já advertiam sobre a necessidade de um serviço geográfico robusto, essencial para a estruturação do território nacional. A segurança jurídica da propriedade depende de um mapeamento público e preciso, que assegure a correspondência entre domínio territorial, registro imobiliário e arrecadação tributária. Contudo, o Sistema Torrens, planejado para garantir a autenticidade do registro de imóveis, falhou no Brasil devido à falta de uma cartografia confiável e à fragmentação das competências cadastrais. Essa situação perpetuou a informalidade e a insegurança jurídica, características que ainda persistem.

A fragilidade do modelo de autodeclaração tem chamado a atenção de instâncias superiores do Judiciário. Recentemente, houve discussões sobre a necessidade de intervenção no Cadastro Ambiental Rural (CAR) para corrigir distorções acumuladas. Em várias ocasiões, ministros do STF ressaltaram a importância de uma integração real entre as bases de dados cadastrais, uma vez que um sistema fragmentado leva ao colapso no controle e na fiscalização. A falta de um arquétipo integrado fragiliza tanto a proteção ambiental quanto a política agrária.

Diante dessa situação urgente, líderes do Judiciário e do Poder Executivo estão negociando a unificação das bases cadastrais dos imóveis no país, visando a correção dos problemas enfrentados. O CAR, por exemplo, é afetado por fraudes na sobreposição de registros, o que tem gerado um intenso debate sobre a forma de garantir a legalidade e a qualidade das informações registradas.

A recente tentativa de integrar o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) com dados da Receita Federal marca um passo importante rumo à reorganização. Essa integração permite um preenchimento automático de informações, reduzindo erros e padronizando dados cadastrais a partir de fontes oficiais. Essa mudança não apenas melhora a eficiência administrativa, mas também reforça a segurança jurídica dos registros fundiários.

Por fim, a realocação da governança de terras para incluir a Receita Federal representa uma mudança significativa. O tratamento do território rural como um ativo jurídico e tributário demanda rastreabilidade fiscal, conectando a propriedade à identificação fiscal do titular. Essa integração de dados fundiários e fiscais é essencial para promover tanto a governança territorial quanto a sustentabilidade ambiental, além de fortalecer a capacidade do Estado de lidar com áreas como segurança pública e a necessária proteção de direitos humanos.

A organização do território rural, respaldada por informações precisas, é fundamental para a construção de uma governança territorial que seja mais segura e eficaz, facilitando a elaboração de políticas públicas que atendam às demandas contemporâneas do Brasil.

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